Queer Blog
31.12.03
 
Passagens de Ano, Corações ao Alto:)))
Hoje, caminhando para um ano em que farei 37 anos, e tendo por segura uma passagem de ano deliciosa, com a minha namorada, os amigos, em minha casa, num bairro cheio de espaços lgbts, não posso deixar de recordar os anos de adolescência e juventude em que, praticamente não conhecendo nenhuma lésbica e nenhum espaço lgbt, me deixava levar para as festas hetero onde, assim como que por milagre, sonhava com um simples beijo roubado à  paixoneta da altura. E, sistematicamente, nada acontecia - e ainda tinha de aturar os rapazes!

[Muito haveria a dizer sobre a estopada que são as festas hetero na adolescência duma lésbica sozinha... E até, já jovem adulta, nas pequenas cidades onde morei... Não sei como sobrevivi a tanto aborrecimento:))]

Como, infelizmente, tenho bem noção que este é ainda o retrato de muitas passagens de ano dos corações lgbt, com muito álcool à mistura (o que, no contexto me parece mais do que compreensí­vel; parece-me até obrigatório:), dizia, como é isto que me parece, vai daqui um abraço de coragem e boa sorte para as vossas passagens de ano! E que tod@s roubem os beijos com que sonham - hoje e em 2004! (como diz a Duras, só lamentar os beijos que não se deram, nunca os que se deram:))

30.12.03
 
Mas há realmente generalismo nos media?
A propósito da polémica sobre blogs lgbts ocorreu-me esta questão: será que um qualquer media pode ser efectivamente generalista e ter simultaneamente públicos-alvo? Não me parece. Todos os produtos media (e, quer queiramos ou não, os blogs são-no) têm um conjunto restrito de públicos-alvo, de interlocutores privilegiados, jogando determinados jogos de linguagem, demonstrando determinadas formas de vida, e não outras. Mesmo as TVs que se dizem generalistas não o são; dirigem-se sim a públicos-alvo seccionados ao longo da grelha. Nenhum produto media que se pretenda generalista tem audiência.

Assim, os blogs lgbts, ou com links lgbts, reflectem apenas parte da produção mediática possível dos seus autores, ou seja, uma parte da sua identidade social e da sua tentativa de reconhecimento social em determinados grupos - sempre em determinados grupos, não na sociedade em geral. Estes grupos podem ser sociais, profissionais, sexuais, religiosos, etc, etc.

Veja-se que um dos blogs lgbts mais geralmente considerado generalista, o do Vale de Almeida, é de facto um blog de esquerda, gay, socio-antropológico, de classe, etc. E pode sê-lo porque o seu autor é socialmente reconhecido em todas essas áreas. O seu generalismo consiste na forma como se dirige simultaneamente a todos esses grupos.

Muitos bloguistas não têm a formação, nem a diversidade de interesses de Vale de Almeida, muitos até pela sua juventude. Mas vão tentando afirmar a sua pertença a outros grupos que não os lgbts, eventualmente grupos a que pertencem profissionalmente, musicalmente, esteticamente, etc. Só um olhar que veja a afirmação de pertença lgbt como algo excessivo por si só - só pela sua enunciação - pode afirmar que esses blogs não falam de nada mais do que da condição sexualmente minoritária dos seus autores.

É claro que é mais fácil dirigir-se a uma comunidade lgbt (pela raridade dos seus produtos media) do que a uma comunidade profissional, etc, etc. Ainda por cima, a esta facilidade acresce uma grande necessidade de expressão, de reflexão emocional e existencial sobre a sua própria identidade, tudo normalíssimo para o percurso dum jovem lgbt, cuja identidade é tão frequentemente estigmatizada socialmente. Daí, me parece, mesmo muitas pessoas que inicialmente não pensavam ter um blog tão marcadamente lgbt, acabam por postar muitas coisas lgbt, porque não se sentem confortáveis para o fazer noutro local, e porque sabem que têm mais facilmente interlocutores.

Por fim, este blog não é lgbt; é queer. E vai irmanado, na minha perspectiva, com o blog do André (all of me). E espero ir demonstrando isso com o tempo (não é coisa que faça questão de discutir já). Nomeadamente através dos links, que não são todos lgbt. O facto é que não é fácil encontrar links realmente queer. E, por outro lado, não convém inundar as pessoas de links. O excesso de links corresponde a uma dispersão que também não chega a ninguém. Por isso, mantenham-se atentos à minha política de links. Não tenho tanto tempo como outros para encontrar todos os lgbts (aliás, penso que deveríamos fazer uma página com eles, porque começam a ser muitos), mas espero, de quando em vez, apresentar umas coisitas queer (e reduzir drasticamente o nº de links lgbts - se bem que, repito, mantendo a sua constante actualização noutro local).

E porquê um blog queer? Porque é uma corrente de investigação/acção pouco conhecida em Portugal e porque lhe acho graça. E porque há poucos produtos media sobre estas questões e talvez, talvez, me garanta alguma visibilidade (e, com ela, o mais importante, algum feedback).

Boas entradas a todos! Vamos a ver se os nossos bloguezitos resistem a 2004:)

23.12.03
 
A blogayesfera
O desenvolvimento da blogoesfera lgbt começa a ser tema de conversa em vários blogs. Há por aí­ uma corrente que diz ser eu e o Miguel Vale de Almeida os papás do boom a que estamos efectivamente a assistir. Este post é para dizer que não concordo; o seu a seu dono. Para mim, os responsáveis pelo boom, e isto não tem tanto a ver com critérios cronológicos, apesar de parecer, são o Casal Gay e o Assumidamente. Foram eles que trouxeram os temas e a linguagem que as pessoas mais apreciam na blogoesfera lgbt, são eles os mais visitados, são eles os mais representativos. São eles que puseram as pessoas, primeiro a ler e, depois, a escrever, sem complexos (e isto é muito importante e é coisa que nunca, nem eu nem o MVA, conseguiríamos).

Dum ponto de vista técnico, e isto é importante na Net, são eles que lançam e divulgam muitos links e que se registraram e auto-divulgaram em muitos motores de busca - a visibilidade internética partilhada é tudo, nestas coisas.

A representatividade do MVA e a minha própria são simbólicas. O MVA tem uma postura blogoesferática anti-blogoesfera (não tem links, não comenta nos blogs dos outros lgbts, não se mistura:( A sua paternidade é cronológica, significativa pelo seu estatuto social e activista. A minha maternidade é também dessa ordem, da ordem da entrada de pessoas mais conhecidas no meio associativo, usando o seu nome verdadeiro. E é só.

Nesta linha, de saudar o ressurgir de um blog, mais um que eu desconhecia e que a Assumida desencantou, o do Paulo Jorge Vieira, Presidente da Não Te Prives, no pinkleopard, agora também a assinar com nome próprio.

22.12.03
 
A invisibilidade do costume
Car@s: este é o post clássico de Natal num blog lgbt. Com quem vão passar o Natal? O Natal implica para vós um afastamento de quem vos é mais querido?

Afinal, todos somos ou não somos família?
Ou vai a família que nunca soube para nós ser família, que nunca nos ensinou a sermos aquilo que somos, que muitas vezes nos deixou crescer em solidão, insistir em ser a nossa FALSA família?

Bem, muita coragem, muito orgulho, muita persistência e muita calma são necessárias para lidar com as habituais chantagens de Natal de quem não quer reconhecer o que é mais importante para nós, o nosso amor, o noss@ companheir@, e se quer chamar de nossa família. Não permitam! Não se esqueçam: os nossos pais são tanto nossos pais quanto nós somos os seus filh@s! O reconhecimento tem de ser mútuo, o respeito tem de ser mútuo. Ninguém tem o direito de nos impor a solidão, o falso celibato, o habitual e mero "tias e sobrinhos". Não! Nós também temos e somos família! E vamos, com a nossa família, visitar alegremente o resto da família. Boa sorte e Bom Natal!

19.12.03
 
E então, as cidades?
O post anterior ficava algo manco se não expuzesse aqui a forma como a estratificação social da acessibilidade ao espaço citadino também me incomoda. Traduzindo: da mesma forma que penso que somos (refiro-me à classe média, já não aos pobrezinhos, e é aqui uma das principais diferenças desta exclusão), dizia, somos excluídos do acesso a determinados espaços selvagens deste planeta (por razões económicas), também o somos do acesso a determinadas cidades, também por razões económicas. Refiro-me aos elevadíssimos custos de alojamento/alimentação e circulação em muitas das mais finas cidades do mundo.

A primeira vez que senti que as cidades se estavam a tornar em condomínios semi-privados foi em Verona. Os custos do estacionamento e do alojamento era tão caros que, simplesmente, não se podia lá ficar. Foi esta coisa de se poder ver, cheirar, mas não se poder lá ficar, que me fez impressão. Aquilo não era nosso. Aquilo era-nos retirado depois de dado; em relação aquilo havia um falso acesso, muito mais subtilmente policiado que o Espaço Schengen.

O que se está a pensar fazer na Baixa, esta história da taxa para circular, é o gérmem disto. Se juntarmos a isso os preços totalmente proibitivos da habitação no Chiado, teremos o condomínio semi-privado Baixa-Chiado em exibição daqui a 15 anos (mais coisa, menos coisa). Esperemos que haja a sensatez de manter espaços para todas as bolsas. A diversidade, mesmo que de passagem, do centro citadino é que lhe dá a cor.

 
And now, something completely different!
Estou de férias! Enquanto vou tendo o computador por perto vou-me dedicar a duas das minhas buscas preferidas: por locais artificialmente construídos para a prática de desporto (de que é paradigma fundador a praia artificial do Japão, e de que agora temos o modestíssimo exemplo das pistas de ski na Serra da Estrela) e por gadgets para jogar jogos imersivos (aqueles em que o jogador usa um capacete que lhe permite ver o cenário do jogo em todas as direcções para onde olhe - aqui um bom link com bons linls sobre realidade virtual, jogos, etc; outra indústria estonteante). Digamos que são a minha ideia de divertimento à grande!

Mas, como sou uma rapariga de extremos, também curto os cenários naturais, os selvagens mesmo. E interrogo-me muitas vezes sobre como é que a gestão turística do futuro vai equacionar estas duas realidades, que são reverso uma da outra: a procura de "tudo o que se quer" nos ambientes artificiais, com a procura do "inesperado e diferente" nos ambientes naturais. O meu palpite é que, se bem que os ambientes artificiais sejam carísssimos, os ambientes realmente selvagens vão-se tornar cada vez mais inacesíveis, por raridade ambiental e também por selecção financeira dos públicos alvo.

O interesse turísitco destas coisas vê-se no seguinte: a tal praia do Japão foi comprada pelo Sheraton... Mas a razão pela qual estas coisas são espectaculares para um dia, mas não para uma semana, está super bem explicada aqui.

Não sei como cá em Portugal não há ninguém a fazer um complexo de piscinas multi-funcionais a sério - nem vos digo o divertido que foi o parque de piscinas em Budapeste este Verão! Além de tudo, tinham uma piscina de ondas, que as fazia aí a 1, 2 metros de altura, que deixava aquela gente de rio totalmente histérica:))) No entretanto já vi uma com ondas de surf mesmo. Vou procurá-la...

17.12.03
 
Uma história simples
Amanhã, a preço simpático, este filme fantástico do Lynch, juntamente com o Público. Não, não é lgbt, não é queer (o seu verdadeiro nome até é "A straight story" - é uma tentativa de pós-queer talvez). É, simplesmente, sobre paz, e caminhar, literalmente caminhar, pela vida sob um céu estrelado.

 
Grita, sente
Deixa que esta voz se bata por mim
já não há razão p'ra que nada seja assim
não é a dor que é cruel
é o amor que rasga a pele

A propósito de um comentário a um post da vizinhança lembrei-me deste verso desta música. Talvez porque tenha concluído um dia que o sofrimento, a perda, o luto, só se pacifica pela reconciliação com o amor, e nunca pela revolta pela sua perda. Porque o amor, esse, fica sempre, a perfumar imperceptivelmente o resto dos nosso dias. E nós sabemos disso. E isso basta para que ninguém que um dia amamos alguma vez possa morrer.

Enfim, há dias em que não é bem assim...

16.12.03
 
Contra a criminalização do aborto e também contra a penalização!
Em solidariedade com as mulheres e com os casais que têm de tomar tão difícil decisão num tão difícil país.
A proposta do PSD, de descriminalizar mas de manter uma pena, uma contra-ordenação punível com multa, é o cúmulo da hipocrisia. Esconda-se a punição das mulheres, nada de julgamentos com gente de esquerda à porta (e, principalmente, nada de julgamentos com gente de direita à porta, também a protestar). E nada de homens julgados por cumplicidade. Mantenham-se os princípios católicos, mas só nesta questão. Nomeadamente, excomunguem-se as mulheres, essas pecadoras! Mas quem lhes disse que tinham direitos?!

15.12.03
 
A discriminação por motivos de saúde
Nobre e urgente o projecto do BE de proibir e sancionar a discriminação de seropositivos em instituições, nomeadamente bancos, seguradoras, etc.

 
Também os temos bons!
Refiro-me ao Alexandre Quintanilha, com imensa credibilidade nacional e internacional, que tem dado umas entrevistas óptimas sobre questões de bioética e, nomeadamente este fds na Pública refere que um dos beneficiários duma clonagem podia ser um casal homossexual - salvaguardando que, aqui como na adopção, e para todos, o processo de acesso deveria ser precedido duma pequena análise. O que é mais interessante é que ele diz, como vem dizendo há muito mas desta forma mais claro, que a clonagem não tem problemas éticos de maior - tem os mesmo que outros métodos de reprodução medicamente assistida - mas tem sim, por enquanto, problemas técnicos (ainda não está aperfeiçoada o suficiente). Brigada Quintanilha por desdramatizares a coisa!:)

 
E bibó futebol!
Não fazia a mais pequena ideia mas parece que não há nenhuma razão em particular para as mulheres não poderem participar nos campeonatos masculinos. Vai daí, uma equipa italiana da primeira divisão, um tal de Perugia, vai contratar uma alemã, a melhor marcadora do mundial feminino, para a sua equipa. Fantástico, não?! Força, gajas!:)

14.12.03
 
Prendinhas e fúrias!
Lá se passou um fds infernal de compras e comprinhas. Mas, o que realmente me enfureceu são, como de costume, as divisões sexistas dos brinquedos infantis.

Já repararam que os bonequinhos da Playmobil são todos homens (piratas, bombeiros, astronautas, etc) à excepção de duas ou três personagens femininas, uma a cuidar de galinhas, outra a cuidar de coelhos e outra com gatinhos!!!!!!! (já me estão a ver a praguejar - eu, que sou uma rapariga contida - no "feliz" Toys Are Us)

Para ajudar a festa o Continente criou secções específicas menina/menino, com as dicotómicas cores rosa/azul, em que tudo o que é de mexer, montar, desmontar é menino, e tudo quanto é boneca, cozinha, shopping é menina!

Deviam era ser todos processados.Todos! (ai Jesus, porque é que eu não sou uma advogada nos States, porquê????!)

 
Partidas
Mais uma partida do sistema de comentários e mais umas cambalhotas diabólicas com o template, que desaparece parcialmente conforme calha :( Não há pachorra!

Conforme reparam continuam por recuperar os comentários anteriores. Eles estão no sistema do Blogger Brasil mas não percebo porque não estão acessíveis. Desisto. Vou aguardar que os servidores deles acalmem.

E um novo sistema de comentários, a pedido de muitas famílias :)

11.12.03
 
A lifetime
Houve outra coisa nos romances do Frederico a que fui sensível; e que aparece também num romance do Leavitt que li recentemente, e é referido mais palpavelmente no último livro da Sedgwick (que vou lendo intermitentemente): trata-se da forma como hoje lidamos com outra percepção com as diferentes temporalidades do que pode ser a totalidade de vida de uma pessoa, em consequência da maior frequência com que, (especialmente a comunidade gay nos anos 80), acompanhamos gente a morrer de doença muito cedo. A Sedgwick exemplifica isto muito bem quando refere que pessoas mais novas do que outras, (como ela, por exemplo), vivem e são vividas pelos outros como tendo provavelmente pouco mais tempo de vida (ela tem um cancro que não tem evoluído bem); no entanto, pessoas muito mais velhas vivem e con-vivem com estas pessoas mais novas, como se fossem viver muito mais. Ou seja, alteram-se as ordens das gerações, alteram-se os legados, alteram-se as heranças. Altera-se o significado de envelhecermos juntos; não há "juntos" neste envelhecer; cada qual morre muito mais no seu próprio tempo e ritmo.

Eu sei que isto é macabro - e excessivamente teórico para falar do sofrimento e revolta daqueles que se vêem confrontados com cronómetros diferentes dos saudáveis, cronómetros em que a volta toda de "a lifetime" é dada muito mais a correr. E não venham cá com essa treta de que todos somos e estamos doentes; é um facto. Mas só algumas doenças nos fazem ver estes cronómetros doutra maneira, só algumas.

O nosso próprio sofrimento? É algo indigno falar dele perante a heroicidade destas pessoas. Ele é mais um infinito abraço.

 
Novos blogs
Alguém veio cá chamar a atenção para um blog novo, seu. Acho muitíssimo bem que o faça; fico felicíssima. Um dos meus objectivos, quando me meti nisto, era alargar esta forma de expressão (porque me parece acima de tudo isso, uma forma de expressão, uma voz, mesmo num espaço social virtual, como este é).

Em muitos posts se nota que as pessoas sentem falta de uma voz que seja mais sua. Não diria, como também vejo escrito muitas vezes, que aqui, nesta escrita algo monologal dos blogs, esteja o nosso eu verdadeiro. Mas penso que podem estar processos de reflexão e autoconhecimento que levam a que o nosso eu social seja de facto mais verdadeiro; para nós.

E interessa-me particularmente que estes blogs sejam de mulheres, pela fraca colonização feminina do espaço internético e, mesmo, da blogosfera. Por isso, fico sempre muito satisfeita quando vejo mais pessoal a aventurar-se, a ganhar ou reganhar o gosto pela escrita, a questionar, a deixar-se mudar.

Por enquanto, a lista de links vai crescendo, crescendo. Brevemente será tão grande que já não fará sentido. Aí será possível fazer selecções mais pessoais e deixar as listagens exaustivas para quem se queira dedicar a isso. Por enquanto, toca a crescer!
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Os crimes da Igreja
O Governo brasileiro veio afirmar que a crítica ao preservativo por parte da Igreja Católica é um crime contra a humanidade. Não sei se isto é dito de forma retórica ou realmente jurídica. Provavelmente a primeira. Mas, mesmo assim, não deixa de ser significativo que os Governos comecem a utilizar o termo crime para referir determinadas atitudes desta Igreja. E refiro-me especialmente a esta simplesmente porque é aquela que tem mais poder de influência no quotidiano dos cidadãos, logo maior responsabilidade.

Nunca hei-de perceber como é que, ainda hoje, se assinam Concordatas que colocam as atitudes desta instituição acima das ordens jurídicas do Estado laico, impedindo, ou talvez só adiando, o julgamento de muitos dos seus crimes (que a história mostrará, mais uma vez, continuam a existir).
É a sua vez

 
Frederico Lourenço
Nada como ter uma molhada de testes para corrigir para a mente divergir para opções outras e morosas: finalmente dispus-me a ler a trilogia do Frederico.

A personagem da trilogia, Nuno Galvão, tem aparentemente imensas semelhanças com o autor: professor universitário nas áreas da literatura portuguesa clássica, na casa dos 40, gay, classe média alta. A forma como essa personagem vive a homossexualidade parece-me ser o mais autobiográfico do romance (apesar de não conhecer o autor). Digo isto porque as dificuldades que encontrou parecem-me serem dificuldades muito prováveis num intelectual lisboeta, gay, hoje na casa dos quarenta.

A principal característica que, penso, um autor que escrevesse um romance do género, com menos 10 ou 20 anos, denotaria é a seguinte: em todas as situações a homossexualidade aparece como algo que é roubado à heterosexualidade. Não tem autonomia, não tem geração própria, não tem um lugar que seja seu. Esta característica, que eu penso ser sociológica nesta geração, não deixa de ser também (e isto também é uma hipótese) o correlato duma fantasia gay que eu vejo algo retratada no último post do Casal Gay: a fantasia de se ter um homem muito homem, ou seja, um homem que tenha tido, ou mantenha, um percurso heterosexual. Como se um homem que se tivesse instalado toda a vida num campo homossexual fosse menos homem. E também a ideia, provavelmente incorrecta, de que um homem que tenha tido um percurso heterosexual é, mais garantidamente, um homem activo (característica de que todos os gays se queixam da falta no "mercado").

Para lá destas considerações mais queer, os romances estão obviamente bem escritos, apesar de me ter exasperado um pouco a excessiva citação académica do primeiro (penso que era um esforço para ganhar credibilidade, além de ser uma forma de não arriscar, logo à primeira, entregar-se ao género romanesco, não fosse a coisa correr mal - este medo é ultrapassado nos outros dois livros). Finalmente, o nosso Frederico é deliciosamente ingénuo e bom rapaz, e usa termos que já ninguém usa, como por exemplo, considerar as situações excitantes ou sensuais, "picantes":))

Resumindo, um escritor e um gay muito bem comportado, que tem recursos para ir mais longe, e irá, assim o seu desenvolvimento emocional o permita. Ah! E obrigada pelos seus livros. E pela sua coragem. Qualidade na literatura gay necessita-se urgentemente em Portugal!
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10.12.03
 
Lésbicas portuguesas casam!
Duas portuguesas lusocanadianas vão casar-se este Sábado em Toronto, naquele que é, provavelmente, o primeiro casamento civil (religiosos já houve muitos) homossexual português. Tudo porque a lei canadiana reconhece o casamento homossexual.
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E porque não há continuação?
Um programa de prevenção da violência e inserção social de jovens no bairro da Quinta da Princesa, em Setúbal, foi o vencedor do prémio anual da Rede Europeia de Prevenção da Criminalidade, atribuído ontem na Dinamarca. O projecto está integrado no "Programa Escolhas", criado pelo anterior Governo em 2001 e elaborado pela Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Risco.
Lá vamos nós estudar o que outros já estudaram cem vezes...
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Ainda a fraude fiscal
Continua a ser escandaloso que, agora por razões formais, a legislação sobre cruzamento de dados fiscais não avance. Depois queixam-se do défice... Que hipocrisia...
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Confrontos, percursos e cruzamentos de vida
Porque concordo inteiramente com Prado Coelho quando ele refere que há determinados diálogos que nunca hão-de avançar meramente pelo confronto de ideias, tomo a liberdade de citar grande parte do seu artigo de ontem. Penso que as ideias só não impedirão o confronto efectivo quando houver convívio; e também através da arte, da partilha de determinadas experiências artísticas, se pode reconhecer a diminuta importância de algumas das nossas guerrilhas.

"O Debate e a Retórica
Por EDUARDO RADO COELHO
Terça-feira, 09 de Dezembro de 2003, Público

A partir de um colóquio sobre problemas da Igreja contemporânea, realizado na Universidade Católica, e no qual foram debatidos temas como a família e a sexualidade, surgiram reacções e contra-reacções, onde houve, como era de esperar, acusações mútuas de fundamentalismo. O prof. Mário Pinto, com a moderação que o caracteriza, fala, nas páginas do PÚBLICO, num "autoritarismo retórico". Pela minha parte, não creio que, enquanto as questões se colocarem no plano do puro debate das ideias, se deva pôr de lado a capacidade de ouvir os outros e de tentar compreender a partir de dentro o que eles defendem. Mas não creio que nestas matérias tudo se resolva num plano do confronto racional das ideias. Ninguém altera as suas concepções fundamentais sobre o amor e o sexo apenas porque uma argumentação mais poderosa o conduziu a isso. Parte-se sempre de experiências pessoais que definem um itinerário de vida, que se configuram a partir de certos dados inconscientes e que são "racionalizadas" no decurso do debate. Mas como todos nós precisamos de argumentos para racionalizar o que vivemos e sentimos, a troca de ideias segundo determinados modelos de confronto intelectual é sempre positiva.

Que me espanta naquilo que Mário Pinto designa como "uma teologia do corpo"? Em primeiro lugar, eu julgo que se pode acreditar em Deus e ter uma experiência da fé defendendo uma sexualidade baseada em princípios totalmente diferentes daqueles que a Igreja católica defende. Ainda ninguém me demonstrou o contrário. Porque o que eu vejo, em termos gerais, é um duplo movimento nas ideias ditas católicas. Por um lado, um extraordinário processo de abertura da noção de sexualidade (cuja legitimidade não contesto) que permite dizer que a opção pelo celibato é uma forma de viver a sexualidade. Isto é, a abertura vai no sentido de alargar a sexualidade à totalidade do ser, criando formas não-sexuais de sexualidade.

Por outro lado, num segundo movimento aparentemente contraditório, recusam-se formas explicitamente sexuais de sexualidade, como a homossexualidade. E porquê? Porque a sexualidade é apresentada num esquema de afunilamento: só há verdadeira sexualidade onde há amor, só há verdadeira vida sexual onde há amor conjugal, só há verdadeiro amor conjugal onde há um projecto de ter filhos (e daí as dificuldades com a interrupção voluntária da gravidez ou os meios anticoncepcionais, em relação aos quais o discurso da igreja se embaraça consideravelmente). (...)"
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8.12.03
 
Ai a nova Tate, a nova Tate...
Prémios Turner
Ceramista Travesti Vence Prémio Turner 2003
Grayson Perry
Anya Gallaccio
Jake and Dinos Chapman
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Confronto no DN
Entre Eduardo Prado Coelho e o Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, sobre sexualidade. E assim vai a nossa Igreja...(conversa com Juan José Tamayo, teólogo católico laico e professor de ciência da religião em Madrid. Tamayo está em Lisboa para uma conferência, hoje, às 17 horas, no Centro Nacional de Cultura, sobre «o futuro da Igreja Católica»)
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AJUDA EM ESTUDO
Assistente da Universidade do Minho, responsável por um projecto de investigação em curso sobre a homossexualidade feminina, procura mulheres para entrevistar na zona norte do país, de preferência com menos de 30 e mais de 40 anos (amostragem que tem de momento em falta). Dois endereços de correio electrónico:
- anabrandao@ics.uminho.pt
- anabr@mail.telepac.pt
As entrevistas são de carácter biográfico e os dados cedidos serão mantidos no anonimato.

Conheço pessoalmente a investigadora. Podem confiar. Vá lá, toca a ajudar. A ausência de estudo e diagnóstico de muitas situações são o primeiro obstáculo ao combate da homofobia em Portugal.

6.12.03
 
Ainda a não discriminação no trabalho
Esta semana tenho vindo a fazer um coming out formal nas minhas turmas. Resolvi fazer notar no meu ambiente de trabalho que existem de facto novos direitos.

Que outro lugar que não uma escola para se advogar um espaço mais respeitador da diversidade, para se ser um simples exemplo dessa diversidade?

É claro que "toda a gente" já sabia. Nunca o escondi, nunca menti. Mas também nunca o afirmei, pelo menos para os alunos. E achei que era altura de acabar com os segredinhos, o faz-de-conta, a hipocrisia. E assumi. E preguei o sermão da diversidade. E eles gostaram. Fiquei com a sensação que me respeitam mais, ou até, que gostam mais de mim. A adolescência aprecia a verdade, né? E querem uma escola melhor, a sua escola melhor. E eu também. É o meu local de trabalho mas também é o meu local de amizade por eles. E de vontade que sejam Gente.
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3.12.03
 
A xoxice dos portugueses
Somos mesmo xoxos! Não é que conquistámos há dias direitos importantíssimos, provavelmente os direitos que mais vão potenciar a mudança e assumpção das nossas vidas de corpo inteiro - estou-me a referir a ser proibido a discriminação no trabalho - e não há festa, nenhuma associação o referiu, nenhum dos blogs vizinhos o celebra, nada!

Meus amigos: toda a gente sabe que as mentalidades não mudam de um dia para o outro, nomeadamente as nossas e a nossa coragem. Mas convenhamos: algo vai mudar na nossa vida. Adeus medo, até depois. Agora, pelo menos por este motivo, ninguém nos tira o empreguinho. É bom ou não é bom? É fantástico!
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2.12.03
 
Fernando Cascais, um caso MUITO sério:)
Enquanto aguardamos publicação em livro destas e doutras reflexões, não deixem de ler a contribuição deste senhor na Interact! Eu sei que tem de se ler pelo menos 10 vezes para se perceber alguma coisinha, mas vale muitíssimo o esforço:)

E aquela da assumpção do corpo masculino como objecto erótico ser o fenómenos mais interpelante da (por ele bem alargada) transgenerização, é uma interpretação algo tendenciosa, mas que se compreende:))
É a sua vez

 
Os espaços em que vivemos
Brevemente vou mudar de Bairro. O valor histórico, simbólico e de trabalho dos diferentes bairros duma cidade é diferente. Existem alguns bairros em que se pode dizer que se formaram clusters (redes de trabalho, de criacção) de determinado tipo (se bem que este conceito é mais usado para redes de trabalho tecnológico-industrial). O Bairro Alto, onde vivo actualmente, é um deles. A nova zona para onde vou deixou que a vertente comercial se sobrepuzesse a muitas outras. Vou para lá com a ideia de contribuir para a alteração dessa visão. Refiro-me à Baixa Pombalina.

Noutro dia caminhei por lá, pela primeira vez com a ideia de que é o meu bairro, não um local de passagem onde se esquece que lá mora e morou gente. Onde se esquece a histórica social, literária, arquitectónica. Para mim, o coração de Lisboa, só divisível com o Chiado, tal lado esquerdo e direito. Um coração nobre.

Cheira-me que ainda mal começou a mudar a minha vida, esta mudança/enraízamento no coração histórico de Lisboa, mas que vai mudar muitíssimo. Provavelmente em sentidos para os quais este blog tem também dado sinal - e que, principalmente, farão de mim mais feliz.
É a sua vez


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