Queer Blog
28.3.04
 
Uma grande e enorme noticia!
Ainda em Bruxelas, ja no fim da reuniao da rede da Ilga Europe, donde vos escrevo sem acentos, para vos dizer que a Opus Gay conseguiu, atraves dum trabalho de lobby porta a porta, fazer arrancar aquela que sera a primeira campanha europeia pro-casamento para todos de sempre! E que ha fortes possibilidades de iniciar esta luta legal em quase todos os paises da UE alargada! Esta sera a primeira vez que a Rede da Ilga Europe inicia uma campanha de moto proprio e tenta marcar uma agenda propria e nao seguir as sugestoes da UE.

Esta ideia surgiu na sequencia dos desenvolvimentos em Espanha, Franca e America.

Estao portanto abertas inscricoes para quem deseje deslocar-se aos registos e pedir a licenca connosco:)

Como ja muitas vezes foi argumentado, nomeadamente em muitos dos nossos blogs, o direito a casar, mesmo que seja so para o recusar, e a conquista simbolica e social mais forte no caminho contra a discriminacao.

Mais detalhes da sustentabilidade legal desta campanha serao dados na pagina e mailling list da Opus.


22.3.04
 
Amigos sobreviventes
Um texto dum amigo que me emocionou:
VÍTIMAS E SOBREVIVENTES!

A Vitima

Quando há 18-19 anos me disseram ao fim de uma tarde triste , que as
minhas análises de HIV estavam positivas, nao só tive muita dificuldade em
compreender o significado disso, como nao quiz acreditar. A médica
generosamente, explicou-me que o que se passava é que eu estava infectado
com o virus,(tinha tido um comportamento de risco, sendo que naquela
altura ninguem usava perservativos, nem era nada fácil adquiri-los), mas
que
provavelmente, nada demais se passaria,porque a maior parte dos
infectados nao contraía doenças.Saí do laboratorio agarrando-me às paredes
e fui de taxi ,sozinho para casa,para tentar compreender aquela bomba
atómica que tinha deflagrado de repente, dentro de mim.
Passado pouco tempo estava com uma tuberculoso viral,e depois com Sarkoma
de
Kaposi nos pés,e depois, com citomegalovirus,e depois com uma
pneumonia,para
além de muitas outras doenças oportunistas que me passaram a transtornar
, diariamente, a minha vida. De 7 5 quilos que era o meu peso normal,
cheguei até aos 45.Hoje tenho 63.
Internado, quase a morrer, durante mais de um mês ,acabei por perder uma
vista.Sem irmãos, e sem qualquer ligação afectiva ,
os pais já septuagenários , resolvi que nao lhes podia dizer , nem achei
que devia pedir-lhes ajuda,pois receava fazer-lhes muito mal . Guardei
para mim o segredo da doença ,e os problemas consequentes, e preparei-me
para morrer,enquanto ao mesmo tempo continuava a ir ao meu trabalho para
que não se percebesse o que me estava suceder : seria simplesmente mais
uma vítima de doença incurável ,pensei,mas de qualquer modo, nao podia
dar-me ao luxo de deixar de trabalhar.Hoje, as coisas sao diferentes ,pois
há possibilidades de reforma, e de apoios para os doentes.Tive segunda
recaída, uma tuberculose"multi serviços" ,ou seja, multiresistente, e ,
então fui
impedido de ir ao emprego,por receio de contágio dos colegas.
Comecei a dar as coisas que tinha,a vender outras, e a dizer ,como por
acaso, o que gostava que fizessem com alguns dos meus haveres, se por
fatalidade morresse, ou seja, preparava-me discretamente, para
morrer,pensando na forma de dar o minimo trabalho aos amigos ,com a
incomodidade da minha morte .
Quando saía dos trabalho e regressava a casa, sentava-me numas almofadas
no chão ao canto da sala ,e pensava, e meditava, e esperava que a morte
chegasse tranquilamente ....
Entretanto, recomeçara uma medicação bastante forte, que viera indicada
por Paris, nessa altura ainda nao havia em Portugal , nem os
antiretrovirais e nem os coqueteiles , e tinha náuseas, e diarreias,mas
não deixava de os
tomar,pensando que havia que dar-lhe a volta.
Inesperadamente, fui nomeado pelo serviço para uma cidade do Alentejo ,e
tive
de aceitar o lugar, pois a recusa era o equivalente ao
desemprego. E fui.Se em Lisboa estava só,com o medo de contar
aos amigos, nessa cidade estava absolutamente isolado ,pois nao conhecia
ninguém, com a agravante de ter de vir discreta e
regularmente a Lisboa, buscar os medicamentos, pois receava que os meus
colegas se apercebessem de algo .Às vezes havia rupturas no
fornecimento, e então , tinha de os
mandar vir do estrangeiro, onde eram mais fáceis de obter,
e paga-los do meu bolso , ou até , eu próprio, ir busca-los pessoalmente
,saindo na sexta
feira, no ultimo avião, para regressar no Sábado, no da tarde, de
forma que ninguem notasse a minha falta .Aluguei quartos, e o carro,
vendi
outras tantas coisas , para poder suportar as despesas,mas os remédios nao
me faltaram .Os incómodos continuavam, embora os médicos quando eu
aparecia
na consulta,e eu não deixava passar nenhuma , fossem sempre encorajadores,
e
mostravam-se admirados com a minha capacidade de resistência,com a minha
perseverança .
Ao fim de uma ano nessa cidade regressei de novo a Lisboa.Fora
promovido!Entretanto, já tinha falado a alguns amigos, que se
encontravam, agora , entre o sentimento de pena, ou de respeito,mas senti
que não me abandonaram ,e isso confortou-me imenso .Acabava de
dar um passo importante, dentro de mim,sem o saber.Falei,comecei a sair de
mim...

Da vitimização à Cidadania da sobrevivência
!

No hospital ,enquanto esperava a vez de ser atendido,manhãs imensas,
,comecei a conhecer outras casos, casos desesperados, tristes, de jovens
que tinham tido toda uma esperança de vida à frente, e que eu via
diariamente fenecerem ,e já nao acreditavam em nada, nem nos médicos,nos
remédios, nem em si próprios, e muito menos na vida que ainda havia
neles .Sem me aperceber comecei a falar, ora com um,ora com outro, todos
conhecidos ali, tentando minimizar-lhes os efeitos das
angústias, referindo-me às vezes ,até a mim mesmo, como um caso, que
afinal, podia servir -lhes de estímulo , a despeito dos incómodos, das
maleitas ,das dôres , das tristezas, da solidão,que eram comum a
todos.Muitos morreram .Mas à medida que os tentava ajudar , eu sem saber,
constatava que no fundo dava-me uma nova a
esperança, e ao querer faze-los acreditar que era possível viver,
isso dava-me vida !
Assim, quando voltava de trabalho,mesmo exausto, tinha sempre alguém a
quem telefonar, para perguntar como estava, para dar uns dedos de
conversa,
para dar uma trago de coragem.Falavamos.

De repente, ou talvez nao,nem sei, resolvi-me a ser consequente, e então,
dei um passo numa direcção que eu talvez nao esperava . Por conversas
entre amigos , vi-me envolvido no voluntariato de uma Associação de
Direitos Humanos de minorias sexuais.E, mais inesperado ainda que isso,
vi-me a dar algum testemunho, em público.Nunca imagira!A minha vida
mudava!
.
.
Ali , todos os dias, da há uns anos para cá , os meus problemas eram ,e
são ainda , muito mais os problemas dos outros,do que os meus, que me
tinham parecido sempre ,e até então, imensoooos... Eu, sem me ter apercebido
, estava agora a ajudar
vítimas.Vitimas da grande exclusão social, do grande
preconceito, da incomensurável ignorância , da sida , mas tamb~em, ao
fazê-lo, sem me
aperceber , eu mudava paulatinamente, de condição.Eu estava a deixar de
ser uma vitima da da exclusão em que eu próprio me colocara,ou nos colocam
,
e que mata, mata! , e passara a ser, contra a incompreensão, ou a enorme
mesquinhez, até de muitos dos meus pares , que trabalhavam com
minorias
sexuais,e me atanazavam também a vida , deixara de ser vítima ,para
passar a ser, aos poucos , um lutador que queria sobreviver,e que queria
que outros, como eu, sobrevivessem ,e passassem a um estádio diferente.
Por entre os dedos tinham-se escoado anos,desde o
dia em que , tinha descoberta a doença, e os dias de agora
dedicados a oscultar as tristezas de tantos, vitímas de enormes
solidões , de tantas exclusões,de violências múltiplas, que me
ajudavam a descobrir , que, afinal,as minhas desgraças ,nao eram nada,
comparadas com as que ouvia, ou com as que via. Eu já nao sabia se
estava
lutar, por mim, ou por eles, mas ao dar testemunho,sentia que a
minha, pouca força, lhes dava força a eles , e essa força deles, me
dava
força a mim.Nao podia desistir!

Á medida que as experiências foram crescendo dentro de mim, com as
exigências de solidariedade a aumentar ,em alguns casos de forma
desmedida, contra todas as minhas expectativas, também sentia a doença
cada vez mais distante , ainda que sempre presente.

Nunca deixando de tomar os remédios,e eram tantos, chegaram a ser 38
pílulas
por dia! , inaugurada a nova modalidade dos coqueteiles, apesar de
alguns efeitos secundarios, incomódos ,sentia força, e cada vez mais, a
obrigação de apoiar os outros , todos aquele@s que para mim apelavam,e
eram muit@s, e de muitos modos . Notava que as minhas cefaleias, e
náuseas,e diarreias, se iam , aos poucos desvanecendo, já nao tendo
qualquer valorização clinica, e ainda menos, pessoal,a despeito dos altos
indices de colesterol e dos triglicéridos .Eu aprendia a viver !
Percebi que ao lutar com outros, pelos outros, estava a lutar por mim,
deixara de sentir tanta solidão,apesar de estar sózinho ,(entre nós,
aqui,devido aos preconceitos e medos ainda é muito difícil alguém
encontrar parceiros afectivos sendo-se seropositivo), mas deixara de ser a
vítima de um grande estigma sociológico,elevara-me, sem querer, à
condicão de ser capaz de ser um actor social. Ou seja, alguém que
estava disponível para ajudar outras pessoas ,
para apresentar propostas alternativas a elas ,e aos outros , para fazer
sugestões novas e diferentes às pessoas ,para denunciar e lutar , para a
levar a
Sociedade a abrir-se a fenómenos com que ela nao queria defrontar-se
Estava a recuperar aos poucos a minha cidadania perdida .
Um dia ,fui a um colóquio sobre "DST", e li num dos prospectos : "Hoje,
com os progressos da medicina , normalmente
estes doentes ja´conseguem ter uma esperança de vida de 15 anos"!
Percebi que já estava fora de prazo,mas mesmo assim não podia
desistir.Nao desistir!
Por isso, e pelo mais ,continuo voluntário desta associação,onde se
juntaram outr@s que sentem e pensam como eu . Sobretudo eu percebi
como os outros que optaram por lutar , que deixamos de ser ,
vitimas da sida, deixamos de ser os vencidos do dia- a -dia, ou vitimas
da exclusão, seja estatal, social, ou pessoal, que leva à solidão, sem
projectos de futuro, mas passamos a ser antes ,agora , como
vencedores
do quotidiano, afirmativamente novos cidadãos sobreviventes!Com
projectos!
Testemunha suficientemente viva para aqui escrever, orgulhosamente , que
é possivel, apesar de tudo, deixarmos de ser vítimas passivas ,e
passarmos a ser úteis,socialmente úteis, com os nossos pares, e com os
outros , lutar pelo Futuro,o que nos dá muita Força para viver, e para
sonhar ,e nos dá o estatuto talvez sortudo, mas certamente honroso ,de
sermos, sobretudo ,e antes de mais ,cidadaõs - Sobreviventes!


16.3.04
 
Em apenas 6 folhinhas Lígia Amâncio sintetiza brilhantemente o papel fundamental que o feminismo tem, hoje, nos dilemas da modernidade. O artigo chama-se “Feminismo e Modernidade” e está publicado nas “Vozes Insubmissas...”.
Em primeiro lugar coloca o problema da exclusão das mulheres, ou seja, o problema do feminismo, como contradição fundadora da modernidade: onde se buscava um sujeito universal excluiu-se, desde logo, as mulheres. [Aqui apenas gostaria de ver mais relativizado este aspecto, no sentido de ser referido como uma das contradições; ou então, falar-se nos mecanismos de exclusão – plural, portanto - que se estenderam a mais sujeitos que não as mulheres, enraizados no próprio projecto de sujeito da modernidade – afinal a República é masculina, mas também heterosexual e branca...].
Amâncio prossegue explicando como é que foi politicamente fundamental construir a diferença dos sexos, ou seja, como foi politicamente fundamental justificar o destino inferior das mulheres, como um destino, não social (porque aí, para os modernos, só pode haver igualdade), mas natural, previsto já nas características do seu corpo. Ao atribuir a esta exclusão um carácter natural e não social impossibilita-se o seu pensamento como dominação.
Apoiando-se em Fraisse, Amâncio explica que este corpo como corpo-aparência (e sua gestão da beleza e do pecado, seu e dos outros – a gestão da exposição) e corpo-reprodutor (e sua maternidade). E mostra como a mulher ficou socialmente reduzida à gestão destes dois corpos, nada mais. Nomeadamente ao ponto de se tentar apagar todo o passado trabalhador das mulheres, tentando fazer delas seres com vivências meramente privadas/domésticas, vivências essas que só na era industrial seriam conflituais com o trabalho público.

Infelizmente o texto não dá nenhum salto para uma ultrapassagem deste encerramento da mulher no seu corpo. Penso que ela passa, por um lado, pela corporalização dos homens, pelo novo valor da sua exposição corporal, pelo maior controlo social sobre o seu corpo. Este processo vai permitir uma maior consciência colectiva dos custos socio-económicos da gestão da exposição corporal que, de momento, são pagos apenas pelas mulheres. Talvez a partir daí homens e mulheres se possam revoltar contra a beleza.

Por outro lado, penso que há que salientar os custos sócio-económicos da gravidez e da criação/educação das crianças, que são cada vez mais suportadas por um maior número de mulheres sozinhas. Os homens na família, as empresas nos seus lucros, têm que partilhar mais a responsabilidade destes custos. Há que encontrar formas de fazer da paternidade algo tão reprodutor quanto a maternidade (e descentrar a maternidade do útero, pois que ela é bem mais social e económica do que isso). Homens e mulheres, estruturas produtivas e familiares, todos têm que ser mães. Chega de sacralizar úteros estatizados em mulheres-mães logo após abandonadas!


14.3.04
 
Socialistas espanhóis e lgbts
Uma eventual vitória do PSOE em Espanha pode trazer o casamento homossexual aqui para o lado (!), visto que está no programa do PSOE, e até talvez a adopção, uma vez que, se bem que não esteja no programa, a coisa esteve renhida.

Ou então será talvez a desilusão de ver o PSOE fazer acordos e escusar-se neles para não cumprir estas suas promessas...


 
Ainda Villas-Boas
Passeando pelos blogs deparei-me com este texto linkado pelo Miguel, em relação ao qual concordo inteiramente com as críticas que lhe faz, pois que o seu autor parece esquecer-se que o dito Sr. tem, neste momento, um lugar político e não fala, como ninguém fala, de um mero lugar científico. Já Sem falar na questão de que as suas afirmações não são meros erros ou ignorâncias; são afirmações que promovem a discriminação e a violência contra um determinado grupo de pessoas. Opto por colocar aqui o texto porque os arquivos do Público tornam-se inacesíveis e sempre foi o único psi a vir a público, em artigo de opinião, contra Villas-Boas:

Adopção e Identidade de Género
Por CARLOS AMARAL DIAS
Domingo, 07 de Março de 2004

Não escondo que as declarações de Luís Villas Boas, presidente da Comissão de Acompanhamento da lei de Adopção, sobre a "infelicidade" de uma criança ser educada por homossexuais, me pareceram tão previsíveis como previsíveis foram as reacções que um sem número de associações tiveram, exigindo a sua demissão. Os argumentos aduzidos pelos dois lados pecaram por pôr de parte a única questão que deve interessar ao cientista, a saber, se há ou não evidência de efeitos psicopatológicos, desenvolvimentais ou na identidade de género de crianças criadas por pais (biológicos ou não) homossexuais. Ora, é justamente aí que a questão se coloca, e é a partir daí que ela deve ser pensada.

Existe uma abundante literatura científica que, no mínimo põe em dúvida, afirmações tão radicais como as proferidas por Villas Boas. Estudos empíricos como os de Bailey et al (1995), Flaks et al (1995), Green (1978) (1982) (1986), Hoeffer (1981), Huggins (1989), Kirkpatrick et al (1981), Koepke et al (1992), Patterson (1994), Turner et al (1990), entre muitos outros, não mostram diferenças significativas entre grupos de crianças criadas por pais homossexuais ou heterossexuais

Aliás, a American Psychological Association, publicou um artigo fundamental, "Lesbian and Gay Parenting", que mostra que não se encontram, na literatura científica, diferenças no que se refere aos aspectos mais marcantes para a criança. O ser cuidado por casais homossexuais não teve impacto na aquisição da identidade de género, no comportamento sexual, no desenvolvimento pessoal ou mesmo nas relações interpessoais da criança, ou seja, na socialização. Também não se encontraram repercussões nos processos de separação/individuação, nas avaliações psiquiátricas, na personalidade ou no desenvolvimento do julgamento moral.

Por outro lado, o relatório técnico da American Academy of Pediatrics, publicado na Pediatrics (Fevereiro de 2002), subordinada ao tema "Coparent or Second-Parent Adoption by Same-Sex Parents", vai no mesmo sentido, ou seja que não há diferenças evidentes entre crianças que cresceram com um ou dois pais homossexuais das cuidadas por pais heterossexuais, seja do ponto de vista emocional, cognitivo, social ou da identidade de género. O que parece afectar o desenvolvimento infantil é a natureza das relações e das interacções familiares, o que é, obviamente uma questão outra. Talvez por isso, a mesma American Academy of Pediatrics, num outro texto, também de 2002, aceita não só a possibilidade de adopção por casais homossexuais, como recomenda aos pediatras que se familiarizem com a literatura publicada sobre o problema.

Parecem assim problemáticas, declarações como as que Villas Boas proferiu, tais como que uma criança adoptada por homossexuais virá a ter interferências como a sua "sexualidade natural", sendo isso "um atentado ao direito das crianças".

Paradoxalmente, comungo contudo inteiramente da sua ideia que "não existe uma homossexualidade genética", sabendo embora das controvérsias e dúvidas científicas. O problema é que a questão das identificações imaginárias, subjacentes queira-se ou não ao discurso daquele psicólogo, não se traduz tão só ou fundamentalmente nas modelações sociais, a partir do discurso e das práticas visíveis. A identificação homossexual (tal como aliás a heterossexual) "obedece" a mecanismos complexos inconscientes, que nos levam a uma "escolha" que se localiza para além da bissexualidade psicológica fundante da espécie, encaminhando uma boa parte daquela, para uma monossexualidade estruturante da identidade de género.

Mas o que me afasta de Luís Villas Boas não me aproxima da procissão discursiva, tipo marketing de baixo recorte, oriunda do outro lado da cena. Não é pedindo a demissão de Villas Boas, que nem sequer me parece imbuído de má fé, mas tão só ingenuamente crente nalguns valores "civilizacionais", que se instala em Portugal um discurso racional, moderno, sobre esta ou outras questões.

E já agora solicitaria ao nosso colega e amigo Eduardo Sá um pouco mais de rigor na argumentação. Não basta, em questão tão delicada como esta, sermos contra ou a favor, neste caso a favor, ou abrir o discurso a significantes tão ambíguos como "carinho". O que precisamos mais do que nunca é de uma coisa, que não é da ordem do carinho. É devolver esta discussão aos seus fundamentos científicos e, por aí, esvaziar o exercício ideológico da militância pela devolução da questão ao seu ponto crucial.

A ciência não se estabelece, nesta como em qualquer outra questão, sobre o senso comum, por muito bom senso que pareça ter, faz-se justamente para além daquele. O problema está, uma vez mais, na escolha do significante mais fácil, mais convincente, porque mais confluente. Ou seja, aquele que só serve para português (não) ver.

Não se sacode a poeira de um país serôdio a não ser pelo rigoroso exercício da razão. E mais não digo.

Professor Catedrático, psiquiatra e psicanalista.


 
Prado Coelho a partilhar, uma vez mais, leituras interessantes

As Palavras e Os Conceitos (1)
Quinta-feira, 11 de Março de 2004

É preciso eliminar os factores de angústia e pressão, é preciso constituir um capital-confiança

Que dois dos mais famosos nomes da filosofia contemporânea tenham decidido escrever (ou melhor, falar) sobre o "conceito" do 11 de Setembro constitui certamente um acontecimento significativo, e que vale a pena ser seguido com atenção, independentemente da maior ou menor concordância. Para dizermos a verdade, o livro tem uma encenadora, que escreve parte das suas páginas: a italiana Giovanna Borradori, que vive neste momento em Nova Iorque, e que esteve em pleno centro dos acontecimentos. É ela que redige a introdução, intitulada "O terrorismo e a herança das Luzes", que depois entrevista Habermas, num texto chamado "Fundamentalismo e terror", e que termina com a entrevista a Jacques Derrida, intitulada "Auto-imunidades, suicídios reais e simbólicos". Cada entrevista é seguida por um comentário explicativo que enquadra e problematiza as respostas. E temos assim "A reconstrução do conceito de terrorismo segundo Habermas" e "A desconstrução do conceito de terrorismo segundo Derrida". Curiosamente, a desconstrução vem depois da reconstrução, mas as duas palavras assinalam os métodos específicos de cada um dos autores.

Jurgen Habermas passou grande parte da sua vida filosófica a transpor a utopia marxista de uma sociedade sem classes para a ideia de situações ideais de comunicação em que a racionalidade discursiva prevalece. Que as pessoas são feitas para se entenderem, eis uma ideia forte, que implica uma posição crítica que vá eliminando as resistências emocionais, os redutos de interesses, as manchas neuróticas, que perturbam a pureza de uma verdadeira comunicação. Ora o 11 de Setembro é algo que de uma forma brutal arrasou este optimismo (que já tinha sido teoricamente posto em causa na polémica que opôs Habermas a Lyotard). Como diz o famoso filósofo alemão: "Desde o 11 de Setembro que pergunto a mim próprio se, em relação a acontecimentos de uma tal violência, toda a minha concepção da actividade orientada para o entendimento não está a cair no ridículo. Até mesmo no seio das sociedades ricas e tranquilas da Organização da Cooperação e do Desenvolvimento Económicos (OCDE), vivemos confrontados com uma certa violência estrutural - à qual nos vamos, aliás, habituando, e que é feita de desigualdades sociais humilhantes, de discriminações degradantes, de pauperização e de marginalização."

Mas Habermas regressa à sua ideia de que no quotidiano vivemos com um fundo comum de convicções, de elementos que percepcionamos como evidências culturais e de expectativas recíprocas. É isto que constitui o espaço público do diálogo. Mas esta ideia de comunicação pode ser perturbada por um certo tipo de mecanismos que criam uma espiral de desconfiança recíproca descontrolada. É o que está a acontecer. Contudo, a solução proposta tem algo de recurso à boa vontade: é preciso eliminar os factores de angústia e pressão, é preciso constituir um capital-confiança. Mas quem dá o primeiro passo? Mesmo que o Ocidente reveja a imagem de si próprio e domestique um capitalismo predador, será que isso trava a máquina adversária?


As Palavras e Os Conceitos (2)
Por EDUARDO PRADO COELHO
Sexta-feira, 12 de Março de 2004

Entre a crónica de ontem e a crónica de hoje, pelo menos mais de uma centena de mortes em terras espanholas. Pergunta-se no momento em que escrevo quem concebeu os atentados. A ETA, como pensa sem hesitações o ministro do Interior espanhol? As forças do fundamentalismo árabe? Uma associação entre a ETA e a Al-Qaeda? Ignoram-se as respostas - mas as interrogações são essenciais.

A posição de Jacques Derrida, no livro que em que participou com Jürgen Habermas, e a que ontem fiz referência ("Le 'concept' du 11 septembre" - Editions Galilée), vai no sentido de considerar que o que se passou com o 11 de Setembro ultrapassa todas as categorias até agora existentes e implica a produção de novos conceitos. Porque as várias formas de guerra ou de combate (e aqui Derrida recorre a Carl Schmitt: guerra clássica, guerra civil, guerra dos "partisans") partem de noções que hoje se transformaram. Por um lado, "a relação entre a terra, o território e o terror" alterou-se, e isto deve-se ao saber, isto é, à tecno-ciência. É a tecno-ciência que baralha a distinção entre guerra e terrorismo. Por outro lado, porque esta "ameaça absoluta, de origem anónima e não estatal", rompeu com a ideia de território. Os países que acolhem redes terroristas e que se recusam a aceitar essa realidade em termos oficiais têm, como é óbvio, graves culpas. Mas que dizer do facto de "os Estados Unidos e a Europa, Londres e Berlim, serem também santuários, lugares de formação e informação para todos os 'terroristas' do mundo?"

Mas Jacques Derrida considera que os actuais atentados "pertencem ainda ao teatro arcaico da violência destinada a estimular a imaginação". Porque aquilo que se prepara, e que de certo modo já ocupa uma parte do nosso imaginário, passa pelas nanotecnologias, isto é, pelo ataque aos "networks" informáticos de que depende toda a vida (social, económica, militar, etc.) das nossas sociedades: "As nanotecnologias de todos os géneros são de tal modo mais poderosas e invisíveis, insituáveis, que se insinuam em qualquer lado. Elas rivalizam no plano micrológico com os micróbios e as bactérias. O nosso inconsciente já lhes é sensível."

A análise de Jacques Derrida vai no sentido de mostrar a relatividade da noção de terrorismo: "Os terroristas eram e são considerados em grande parte do mundo como combatentes da liberdade e heróis da independência nacional. Quanto ao terrorismo dos grupos armados que impuseram a fundação do Estado de Israel, era nacional ou internacional? E os dos diversos grupos de terroristas palestinianos de hoje? E os irlandeses? E os afegãos que se batiam contra a União Soviética? E os tchetchenos?"

A grande questão está em saber qual é a melhor forma de combater as acções terroristas: homogeneizando ideologicamente a noção ou pluralizando-a em termos de maior rigor conceptual?

(e falta o III)


 
Sousa Tavares igual a si próprio
Ia pegar na crónica deste senhor, aliás uma repetição duma que fez em Junho de 2000, intitulada "O caminho mais fácil", que teve resposta da Opus Gay no Público, com uma resposta dele que diz tudo...
Mas felizmente estão todos bem atentos, e não só os lgbt, e espero que mais respostas públicas surjam.


 
De volta para a civilização...ou não?
Fui acampar com os miúdos. Sem rádio, televisão, etc. Andámos quilómetros. Adoro andar na natureza; adoro sentir as coisas à medida do meu corpo, tempo, espaço, velocidade. Muitas vezes já disse a amigos e conhecidos que, se um dia me passar de vez, me ponham em montanhas altas com muitos caminhos; é que não há sofrimento que resista:)
Enchi a barriga de céu estrelado (em relação ao qual as luzes da cidade são vãs vaidades) e os ouvidos de brisa.
Mesmo com os miúdos umbilicalmente ligados aos seus telemóveis a tragédia de Madrid demorou 24 horas a chegar.
E quando voltei a casa, a Lisboa, esta era já outra - Lisboa na rota do terrorismo, à espera...


4.3.04
 
The Economist:
Equal rights

The case for gay marriage
Feb 26th 2004
From The Economist print edition

It rests on equality, liberty and even society
SO AT last it is official: George Bush is in favour of unequal rights, big-government intrusiveness and federal power rather than devolution to the states. That is the implication of his announcement this week that he will support efforts to pass a constitutional amendment in America banning gay marriage. Some have sought to explain this action away simply as cynical politics, an effort to motivate his core conservative supporters to turn out to vote for him in November or to put his likely "Massachusetts liberal" opponent, John Kerry, in an awkward spot. Yet to call for a
constitutional amendment is such a difficult, drastic and draconian move that cynicism
is too weak an explanation. No, it must be worse than that: Mr Bush must actually believe in what he is doing.

Mr Bush says that he is acting to protect "the most fundamental institution of civilisation" from what he sees as "activist judges" who in Massachusetts early this month confirmed an earlier ruling that banning gay marriage
is contrary to their state constitution. The city of San Francisco, gay capital of America, has been issuing thousands of marriage licences to
homosexual couples, in apparent contradiction to state and even federal laws. It
can only be a matter of time before this issue arrives at the federal
Supreme Court. And those "activist judges", who, by the way, gave Mr Bush his
job in 2000, might well take the same view of the federal constitution as their Massachusetts equivalents did of their state code: that the constitution demands equality of treatment. Last June, in Lawrence v Texas, they
ruled that state anti-sodomy laws violated the constitutional right of adults
to choose how to conduct their private lives with regard to sex, saying further that "the Court's obligation is to define the liberty of all, not to mandate its own moral code". That obligation could well lead the justices to uphold the right of gays to marry.
That idea remains shocking to many people. So far, only two countries-Belgium and the Netherlands-have given full legal status to same-sex unions, though Canada has backed the idea in principle and
others have conferred almost-equal rights on such partnerships. The sight of homosexual men and women having wedding days just like those enjoyed for thousands of years by heterosexuals is unsettling, just as, for some people, is the sight of them holding hands or kissing. When The Economist first argued in favour of legalising gay marriage eight years ago ("Let them wed", January 6th 1996) it shocked many of our readers, though fewer than it would have shocked eight years earlier and more than it will shock today. That is why we argued that such a radical change should not be pushed along precipitously. But nor should it be blocked precipitously.

The case for allowing gays to marry begins with equality, pure and
simple.
Why should one set of loving, consenting adults be denied a right that other such adults have and which, if exercised, will do no damage to anyone else?
Not just because they have always lacked that right in the past, for
sure: until the late 1960s, in some American states it was illegal for black adults to marry white ones, but precious few would defend that ban now
on grounds that it was "traditional". Another argument is rooted in semantics: marriage is the union of a man and a woman, and so cannot be extended to same-sex couples. They may live together and love one another, but
cannot, on this argument, be "married". But that is to dodge the real
question-why not?-and to obscure the real nature of marriage, which is a binding commitment, at once legal, social and personal, between two people to
take on special obligations to one another. If homosexuals want to make such marital commitments to one another, and to society, then why should they be prevented from doing so while other adults, equivalent in all other
ways, are allowed to do so?

Civil unions are not enough
The reason, according to Mr Bush, is that this would damage an important social institution. Yet the reverse is surely true. Gays want to marry precisely because they see marriage as important: they want the
symbolism that marriage brings, the extra sense of obligation and commitment, as well as the social recognition. Allowing gays to marry would, if anything,
add to social stability, for it would increase the number of couples that take
on real, rather than simply passing, commitments. The weakening of marriage has been heterosexuals' doing, not gays', for it is their infidelity,
divorce rates and single-parent families that have wrought social damage.

But marriage is about children, say some: to which the answer is, it
often is, but not always, and permitting gay marriage would not alter that. Or it is a religious act, say others: to which the answer is, yes, you may believe that, but if so it is no business of the state to impose a religious choice.
Indeed, in America the constitution expressly bans the involvement of
the state in religious matters, so it would be especially outrageous if the constitution were now to be used for religious ends.

The importance of marriage for society's general health and stability
also explains why the commonly mooted alternative to gay marriage-a so-called civil union-is not enough. Vermont has created this notion, of a legally registered contract between a couple that cannot, however, be called a "marriage". Some European countries, by legislating for equal legal
rights for gay partnerships, have moved in the same direction (Britain is contemplating just such a move, and even the opposition Conservative leader, Michael Howard, says he would support it). Some gays think it would be better to limit their ambitions to that, rather than seeking full social equality, for fear of provoking a backlash-of the sort perhaps
epitomised by
Mr Bush this week.
Yet that would be both wrong in principle and damaging for society.
Marriage, as it is commonly viewed in society, is more than just a legal contract. Moreover, to establish something short of real marriage for
some adults would tend to undermine the notion for all. Why shouldn't
everyone, in time, downgrade to civil unions? Now that really would threaten a fundamental institution of civilisation.
**************
Gay marriage

New fuel for the culture wars
Feb 26th 2004 | WASHINGTON, DC
From The Economist print edition
AP

The proposed constitutional ban on gay marriage adds thorny legal and political questions to a troublesome moral debate

AT A speech to the Republican Governors' Association on February 23rd, George Bush argued that voters face a stark choice between "two visions
of government": one (his) that encourages individual freedom, the other
(the Democrats') that "takes your money and makes your choices". Twelve hours later, he presented Americans with an equally stark question: do you
want a constitutional ban on gay marriage? By any measure, this would take away gay Americans' choice. By supporting the proposed ban, President Bush has re-ignited the culture wars, given a new, possibly nastier character to the presidential race and committed America to a long, maybe unresolvable, debate about fundamental mores.

America's culture wars have the virtue of ventilating profound questions of personal behaviour and responsibility. Their drawback is that they are sometimes poisoned by majoritarian actions. So it may be this time. The underlying issue of gay marriage turns on basic attitudes towards sexuality, on the extent to which marriage should be buttressed by law, and on whether gay marriage would undermine the institution itself. But the particular form in which the issue is now being presented-as a proposed amendment to the federal constitution-raises questions about who should make decisions
like this and what is the proper role of the state and federal governments.

Supporters of a constitutional ban want to stop gay marriages
everywhere, of course. But in practice they focus on a slightly different issue: how to stop gay marriage spreading from state to state through a clause in the constitution that says "full faith and credit shall be given in each
state to the public acts, records and judicial proceedings of every other state."
The fear is that, as the president put it, "some activist judges and
local officials" will permit gay marriage in one place. Gays from all over the country will then rush to marry, return home and sue in their home
state's courts to have their marriage contract recognised. In support of this view, proponents of the ban point out that, in practice, states always
recognise each other's marriage laws. Gay marriage would be no exception.

They point out that the federal government has twice stepped in to
strike down marriage laws deemed acceptable in one state but not elsewhere. In both cases, this involved polygamy among Mormons, first when Lincoln banned bigamy in 1862 (the Morrill Anti-Bigamy Act) and again in 1890 when the federal government insisted Utah outlaw polygamy as a condition of becoming a state. If the feds can ban polygamy, why not gay marriage too?

Lastly, they argue, a constitutional ban would stop only marriage among homosexuals, not civil unions. States could still, they claim, write
their own laws granting gays some legal rights short of marriage, as Vermont
has done.

Opponents of the ban reject these arguments one by one. Most important, they say, proponents are factually and legally wrong about the constitution's "full faith and credit" clause. It has long been established in law that if an issue comes within the purview of states, and if states have their
own public policy on that issue, then they do not have to recognise another state's law. This exception is essential to the operation of the federal system itself, which would otherwise be rendered meaningless.

There is no doubt that marriage is a matter for the states, not the federal government. It has been so for centuries. There is no doubt that many states have their own policy, since 38 have passed "defence of marriage acts" defining marriage as the union of a man and woman. It is true, opponents concede, that states have always recognised each other's marriage laws.
But that was because there was consensus. Now that the consensus is fraying, Texas (say) will not be required to recognise a gay marriage made in Massachusetts. The result will be messy, but that is the price of federalism.

Moreover, opponents of a ban point out, the "full faith and credit"
clause gives Congress a role in deciding "the manner in which such acts,
records and proceedings shall be provided". Congress made clear its view by passing, in 1996, its own Defence of Marriage Act. In sum, opponents say, the constitutional defences against extending gay marriage by judicial activism are strong.

Lastly, they claim, proponents of a constitutional ban are plain
wrong-or lying-when they say their amendment would permit civil unions. As it stands, the proposal before Congress would prevent "marital status or the legal incidents thereof [being] conferred upon unmarried couples or groups".
If the phrase "legal incidents thereof" means anything, it must refer to civil unions. These would be banned.

Could such an amendment pass? Since the Bill of Rights, there have been only 16 amendments in 200 years. Most guarantee or extend the operation of democracy (such as women's suffrage), rather than defend social norms (such as Prohibition). Any amendment requires the approval of three-quarters
of the states, plus a two-thirds majority in both houses of Congress.

This looks hard, but is not out of the question. Three-quarters of the states have passed laws banning gay marriage, though some might vote against an amendment on states'-rights grounds. The decisive factor, though,
will be public opinion.

It is often said that Americans disapprove of gay marriage but support civil unions. Not so. Gay marriage is more unpopular than unions (about 60% dislike the former), but, depending on how the question is asked, a
small majority disapproves of civil unions too. That suggests that public pressure on legislators could be strong.

But opinion is fluid. It is sensitive to news. Support for an amendment rose when the Supreme Court struck down Texas's sodomy law last year. It
shifts depending on how the debate is framed: the more you talk about equal rights under the law, the greater the support for civil unions. And there is a yawning generation gap: 55% of 18-29-year-olds support gay marriage, but only 21% of those over 65.

Mr Bush may therefore be taking a bigger political gamble than is
apparent on the surface. Democrats complain that by supporting a constitutional
ban he is seeking a "wedge issue" for the election (something that splits Democrats but unites Republicans). And it is true that Republican-voting evangelicals strongly support a ban, and may well turn out in even
greater numbers as a result. But Republicans too are split on the ban.
Libertarians dislike legislating on sexual behaviour. Federalists deplore the
proposed overriding of a core competence of states. Around 1m gays voted
Republican in 2000.

So there are costs as well as benefits for the president. And those
costs may spread to the country as a whole. In Roe v Wade in 1973, the Supreme Court imposed a uniform law on a country divided and in flux on
abortion.
The issue still splits the nation. A constitutional amendment would stop state experimentation and impose a national norm on a country divided
and in flux about gay marriage. Debate could fester for years.


3.3.04
 
Se não se podem matar ou curar, então esterilizem-nos!
Tentando reflectir um pouco sobre as declarações do Villas-Boas para a construção dum espaço no Maria Maria de hoje na Voxx, cheguei à conclusão que este senhor apenas diz claramente aquilo que outras decisões demonstram mas não dizem, ou seja, que aos homossexuais deve-se esterilizar, nem que seja por meios sociais, como por exemplo negando-lhes a adopção e a procriação medicamente assistida.

E porque é tão importante passar esta imagem de esterilidade dos homossexuais, quando, de facto, se sabe bem que não o são, e que sempre tiveram montes de filhos, em todas as sociedades e em toda a história? Trata-se apenas de re-afirmar uma esterilidade bem mais forte, uma esterilidade simbólica e metafísica, que tem a ver com ligar determinadas pessoas e práticas à ausência de geração, ou seja, à ausência daquilo para o qual Deus fez a natureza, ou seja, gerar e reproduzir. O objectivo último é colocar estas pessoas como indignas de Deus.

Também o raciocínio habitual de César das Neves, de que há pessoas que vivem só para o seu próprio prazer, tem a ver com esta mensagem, a de que há práticas que não são geradoras de vida, que não respeitam o desejo de Deus. O salto das práticas inférteis, ou que causam infertilidade (lembram-se do que se dizia da masturbação?) para as pessoas inférteis, é um salto simbólico que se dá rapidinho, rapidinho...

No fundo, a questão não é a de os homossexuais serem inférteis ou estéreis, porque sabe-se bem que objectivamente não o são; a questão é que é urgente que se mantenha essa sua imagem na opinião pública, e que as leis o reforcem, para que se mantenha a sua indignidade perante Deus, a sua contra natureza, a sua cidadania de segunda, a sua discriminação.

Ora, estão fritos, porque não só nós temos muita filharada, como já adoptamos muitos, e como procriamos imenso, mesmo sem recurso a coito heterosexual:)) E esta, hein?

P.S - recorri nesta questão ao Dictionaire de l'homophobie. Não costuma ser particularmente interessante mas neste ponto até acho que foi. Tem um artigo sobre Portugal escrito por Fernando Cascais. O artigo está bom e equilibrado (tendo em conta o espaço disponível, que não devia ser muito). Tem uma incorreção: diz que as uniões de facto necessitam de regulamentação - maldita armadilha jurídica, que singrou durante anos dentro das próprias associações! Ainda gostava de saber quem foi o inteligente que a lançou...


 
De novo vómitos
Eu é que não devo andar bem, mas tive outro ataque: ele são os deputados a votar contra as suas prórpias declarações de voto e contra as suas consciências em questões que dizem ser de consciência; ele é o Ferreira Torres a pontapear o que lhe apetece (só quem não viveu naquela terrinha feudal é que se admira com isto...), enfim - este país repugna-me...


 
Futebol feminino
Fui ver um jogo há uns dias, talvez pela primeira vez. Gostei. Gosto sempre de ver feitos desportivos de mulheres. Gosto sempre de um bom pêlo na perna:)

Mas dei por mim a pensar noutra coisa: o futebol feminino é a possibilidade de inserção social comunitária para as lésbicas rurais que o sacerdócio é para os gays. Isto porque me surpreendeu o nível de apoio que as jogadoras tinham do seu bairro, da sua terrinha... Quase todas lésbicas (eu sei que isto é polémico mas quem vive nesse mundo que me desminta), quase todas assumidíssimas nos balneários e não assumidíssimas nas terrinhas, quase todas de cabelo comprido, quase todas num processo de coming out, muitas vezes rural, muito curioso. E quase todas sem qualquer grau de cultura lésbica, quase sem necessidade de identificação cultural, pelo menos aparentemente - porque sei que, quando alguém consegue introduzir nesse meio a curiosidade por um filme, um livro, o interesse é exponencial, devorador, e a necessidade identitária parece ganhar consciência.

Adorava conhecer a cultura popular lésbica portuguesa, no sentido das culturas rurais, das culturas operárias, etc. Tenho a certeza que há gente a negociar a sua vida e a sua identidade de formas muito curiosas... Apesar de, infelizmente, acreditar que há muito mais gente a não o conseguir e a viver psicosocialmente na miséria.


 
Monstruoso
Fui ver o Monster. Talvez tenha sido o primeiro filme que me fez sentir fisicamente mal disposta, como se estivesse estado a vomitar para dentro (peço desculpa pela imagem mas realmente deu-me a volta às tripas). Ao contrário de algumas pessoas, eu pertenço às outras tantas que não considero a personagem exagerada ou com maneirismos. A mim convenceu-me como história de profundo desamor (como bem notou o meu amor) e sacanagem. Com a responsabilidade e cumplicidade de todos nós, como sempre é.
Vão então preparad@s; mas vale a pena ver.



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